Compartilhar tristeza, vale?

Saturday, October 03, 2015




Essa semana fiz minha segunda visita ao médico-tabu - o psiquiatra. Isso porque ainda escuto comentários ácidos e desconfiados sobre a procedência e importância desse profissional. 

Faço terapia há 4 anos. Sou o tipo de pessoa que mais escuta que fala, que mais observa do que sei deixar observar, que mais dá conselhos que recebe, mais fechada que aberta, mais tímida que impulsiva e por aí vão os adjetivos de alguém que se guarda pra si. Na terapia, encontrei um espacinho de uma hora dentro das 167 horas semanais onde posso falar sobre minha vida, sem censuras.

Infelizmente, a fala não está funcionando por si só. O tanto que guardei e resguardei em mim, acabou tomando proporções maiores. A ignorância alheia é interessante: se acha sábia, apta para julgar e dar um veredicto. O pior é acreditar nele. No modelo da sociedade atual, dos compartilhamentos de fotos de momentos de descontração em redes sociais, as pessoas parecem ter perdido o bom senso e a delicadeza no olhar de ver o outro e saber que por trás de um rosto existe uma história.

Depressão é tabu: tá na moda (vide a pop art na capa do remédio, a figura que ilustra esse post); é só tristeza; é capricho; todo mundo tem; é direito de quem foi ao inferno e voltou. Eu achava exatamente isso, e me castigava ainda mais.

Vou falar meu lado. Da tímida com poucos mas bons amigos, passei àquela que desmarca os encontros em cima da hora, não pode ir à balada, à praia ou qualquer lugar público lotado de gente, consequentemente, percebi meus poucos amigos se afastarem de mim, algo natural, não os culpo.

Nunca fui boa com small talk, puxar assunto, fazer sala e afins, mas me esforço sempre que tem alguma festa de família, reunião de amigos dos meus pais... Mas, ultimamente, me retiro e não falo com ninguém, a ideia de ter conversas paralelas me cria uma angústia sem fim.

De pessoa que prefere "ficar em casa e ver netflix", passei a pessoa que se aterroriza com a ideia de ir a algum lugar lotado de pessoas, especialmente da minha faixa etária. Na pior hipótese nem filme, nem música preenchem meu vazio. Sou eu e o teto do meu quarto.

Não era o estágio da minha vida, mas era em um lugar incrível, com uma filosofia rara em uma empresa que eu admiro até hoje, com pessoas generosas, na medida do possível, com um salário invejável por uma carga horária mega flexível. Eu me demiti porque não aguentava dar "boa tarde".

Sentada no computador, como agora, escrevendo esse post ou comendo ou ouvindo música ou vendo um filme, um soco interno pode me acertar,assim, sem avisar o danado, de tal maneira que me desnorteia. Perco a perspectiva da vida. Nada parece bom, ruim ou mais ou menos. A vida nem preto e branco é. Desbotada ao ponto de desaparecer. Um vazio que me faz preferir estar sentido ódio do mundo, até mesmo arranjar um jeito de auto-punição, do que sentir aquele grande e avassalador nada. Um nada que faz a moldura da janela do meu quarto se torne atraente...

Essa é a depressão como eu conheço.Aliás, bom frisar que depressão tem vários níveis, grey areas como tudo na vida. Conheço casos de pessoas que, com depressão severa, não conseguem sair da cama, não conseguem tomar banho, comer, falar... Agradeço a Deus ou deuses ou a alguma energia cósmica ou ao que for que exista aí fora no universo, por ter grande apoio dos meus pais e uma forcinha dentro de mim que me arrancou a insatisfação de ficar acomodada. Isso me moveu e fez com que procurasse ajuda.

Não vou dar o nome do remédio que me foi indicado, ao menos por hora, não quero fazer a mínima apologia ao consumo de antidepressivos. Como o filme 'Geração Prozac' constata, o antidepressivo é aquela brecha, aquele espaço para você respirar e colocar a cabeça no lugar. Ganhar de volta a percepção que a depressão tirou.

Quis compartilhar essa experiência porque pode ser que chegue aos olhos de quem se identifique e precise tomar uma atitude antes que o caso se agrave. E também como forma de expor um pouco mais de mim, o que é tão difícil, ainda que virtualmente.

Espero conseguir compartilhar aqui minha experiência com o remédio. De maneira despretensiosa e franca porque abro meu instagram, facebook, e vejo a Era do minha-felicidade-vai-ser-completa-quando-apertar-o-botão-compartilhar-e-os-meus-mil-e-um-amiguinhos-virtuais-perceberem-o-quanto-sou-cool-e-aproveito-a-vida-ao-maximo.

Depressão dói, mas pelo menos é de verdade e tem tratamento.


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2 comments

  1. Infelizmente eu sei bem o que é passar por isso Malu, e é uma das fases da minha vida que eu queria esquecer mas não dá quando ainda estamos passando por ela, no meu caso foi diferente do seu, mas a vontade de se afastar de tudo e de chorar sempre está sempre ali mesmo quando queremos ter força para mudar é complicado. Admiro muito você ter contado a sua história aqui, pode ajudar a abrir o olho de alguém que está passando pelo menos e precisa de ajuda.
    Como você disse: Depressão dói, mas pelo menos é de verdade e tem tratamento.

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    1. Sim, sim, Lívia! Obrigada pelo reconforto :)

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